A notícia da tragédia chegou por meio das redes sociais. A empregada doméstica Fabiana Oliveira, de 39 anos, estava em Casilândia, cidade vizinha a Itambé, onde mora, no Sudoeste da Bahia, quando começou a receber de amigos e parentes vídeos da enchente. Em pouco tempo, reconheceu que uma das ruas alagadas era a do seu endereço.
A água chegava ao teto das residências. Fabiana começou a se mobilizar para voltar para a casa em que morava com os dois filhos, de 6 e 11 anos, na tentativa de salvar alguma coisa.
— Sabe o que é você ver a sua vida ir embora do nada? Você ver o lugar onde você morou ser levado pela água? É uma sensação de tristeza. Até agora eu estou sem acreditar no que aconteceu na minha vida e na dos meus vizinhos — relatou Fabiana ao GLOBO.
A residência era herança dos pais. Ao remover o lodo do que era sua casa, Fabiana encontrou a máquina de costura de sua mãe, instrumento que servia para “remendar lençóis, arrumar uma calça”, quando ela ainda era criança:
— Perdi a casa, perdi os móveis, tudo mesmo. Só não estou muito triste porque encontrei a máquina da minha mãe, que é uma relíquia. Era a coisa que eu mais queria encontrar e está intacta, pena que em uma situação destas.
Fabiana e os dois filhos estão temporariamente na casa de parentes.
— Eu tenho esperança de ter uma casa nova. A gente procura um meio de recomeçar — afirma.
Em Itajuípe, a cerca de 50 quilômetros de Ilhéus, no Sul do estado, depois das cheias, os 20,3 mil moradores sofrem com a falta de água potável para beber e cozinhar.
Onde a água já baixou, os vizinhos se ajudam para limpar os imóveis danificados. Em outros pontos, contam os moradores, a água suja segue entrando nas casas, atingindo o nível de 40 centímetros de altura. Nas zonas rurais, ainda há pessoas ilhadas.
Apesar do risco do contato com a água suja pelo transbordamento do Rio Almada, muitos moradores, segundo as autoridades, se recusam a deixar suas casas, com medo de perder o que não foi destruído pela tragédia. O prefeito Marcone Amaral contou que, na noite de domingo, algumas pessoas recusaram o transporte em botes motorizados dos Bombeiros.
‘Recomeçar do zero’
O cabeleireiro José Oliveira Filho, de 44 anos, preferiu deixar a residência em busca de um lugar mais seguro. Com a mulher, hospedou-se em uma pousada, paga com parte da economia que fez ao longo de 25 anos de trabalho em salões.
— Terei que reconstruir tudo do zero. Estou desde sábado sem conseguir voltar para casa. Olho para as imagens e percebo que o alagamento chegou à altura do meu pescoço, e eu tenho 1,70m — diz Oliveira.
A advogada Caroline Hage, presidente do Rotary Club de Itajuípe, começou uma campanha de arrecadação de dinheiro para os necessitados. Até a manhã de ontem, haviam sido doados R$ 18 mil, valor que será usado na compra de água e alimento. De acordo com a prefeitura, são cerca de 700 famílias desalojadas, abrigadas principalmente nas escolas da cidade. Ao todo, 70% da população da cidade foi afetada. — A cidade inteira trabalha para conter os estragos. A inundação, com a cheia do rio, já é impossível de refrear — diz Caroline.
— Recebemos algumas doações e conseguimos comprar água, mas não é suficiente. Estamos pedindo socorro ao governo do estado e ao governo federal, que prometeram ajuda, mas ainda não chegou. Estamos pedindo, na verdade, ajuda para qualquer pessoa — admite o prefeito Marcone.
O presidente Jair Bolsonaro afirmou ontem que deve editar no início de 2022 uma medida provisória abrindo crédito extraordinário de R$ 200 milhões para mitigar os efeitos dos temporais na Bahia. Bolsonaro não detalhou de que forma os recursos serão utilizados.
A Empresa Baiana de Água e Saneamento (Embasa) informou que as chuvas “provocaram avarias em equipamentos, rompimentos em adutoras e redes distribuidoras de água e impediram o acesso às áreas onde estão localizadas captações ou estações de tratamento”. A empresa diz que trabalha para recuperar os sistemas no menor prazo possível.
Fonte: O Globo