Eu como a maioria das crianças nascidas antes do século XXI, fui criada na “rua”. Arrancar o tampão do dedão no asfalto era uma marca registrada e mesmo com o sangue escorrendo entre os dedos, a brincadeira continuava.
Sim, posso dizer que fui uma criança raiz!
Adorava fazer golzinho com chinelo na rua e sair correndo atrás da bola quando ela ia para a ladeira. Time com camisa, time sem camisa. Quem chuta busca. Gordinho vai para o gol e por aí vai…
Me lembro o misto de emoções que sentia quando a bola caia no quintal da vizinha que não suportava mais a bagunça que fazíamos na rua, mas precisávamos criar coragem para pedir a devolução da nossa bola. E detalhe: não éramos recebidos com flores não viu?!
Caramba, que saudades!
Quem foi criança no século XX, com certeza, carrega doces lembranças do passado que, muitas vezes, nem parecem tão distantes assim. Naquela época, a vida girava em torno de brincar. As crianças se divertiam na rua, no quintal de casa ou na casa do coleguinha.
Sou da época em que o Merthiolate ardia quando minha mãe passava em meus inúmeros machucados. Nos meus joelhos as marcas permanecem até hoje, porém mais que uma marca física, a lembrança emocional é muito maior.
Me dói muito pensar que convivemos com uma geração que não vai ter história para contar. Com o avanço tecnológico essas práticas perderam espaço e, hoje, são substituídas por jogos nos celulares, computadores ou coisas semelhantes.
Realmente, os tempos mudam e as práticas também, mas uma pergunta que sempre me incomoda é o porquê essas brincadeiras foram praticamente extintas? Apesar de os jogos e relações pelo celular trazerem uma distração e um entretenimento muito grande para as crianças, não conseguem substituir os jogos de ruas.
Esses jogos conseguiam desempenhar um papel para além do próprio entretenimento, eles representavam um fortalecimento de laços de amizades, convívio em sociedade, formulação de estratégias, espirito de equipe, pensamento crítico e etc. Mas, tudo isso acontecia de maneira implícita, estava escondido por trás do verdadeiro objetivo: se divertir.
Se me perguntassem o que mais sinto falta da minha infância com certeza eu diria que são as brincadeiras na rua, afinal, a diversão era garantida e olhando, hoje, pra trás percebo que isso desempenhou um papel muito importante, para além da própria diversão.
O retorno dessas atividades que exercem um papel incrivelmente maior do que realmente demonstra preferência, não só tornará a sociedade mais inclusiva, pelo fato dessas brincadeiras desconhecerem e raça e gênero, como também fomentará as relações sociais e interpessoais que sempre estão presentes no jogo.
Vivemos agora uma geração do Merthiolate que não arde, e que tudo parece ser tão fácil. Dá para comprar sem sair de casa, se graduar sem nunca pisar numa sala de aula, jogar sem precisar de esforço físico.
Precisamos sair desse casulo, retroceder e entender que existe uma ação correta para cada situação e que nem tudo na vida é tão fácil assim.
Você já parou para pensar que o Google talvez não saiba de tudo? Que um conselho matriarcal é muito melhor do que o comentário de uma blogueira? Que um joelho ralado te ensina mais sobre a vida do que qualquer jogo que você consiga zerar?
A vida muda a todo momento e é preciso eternizar momentos, mas não dá para fazer isso por trás de uma tela de celular.